Fiasco do PIX: quando a comunicação falha

Observatório Político de Ouro Branco

por Graci Marques*

Se você esteve no Brasil sabe bem do que estou falando: o episódio da “ressaca do Pix” comprova que, num mundo digital, é preciso ter uma comunicação afiada, ágil, atenta e um núcleo de redes preparado para todas as situações, inclusive crises. Não vou aqui analisar o projeto, mas a crise institucional que se criou pelo simples fato do Governo Lula não ter se preparado para um assunto que mexe com a vida e o bolso de todo mundo sem um plano de comunicação. E, como jornalista, não tenho como defender um gesto desses: com informação correta, pânico não se sustenta.

O primeiro erro foi ter subestimado o impacto das novas regras de fiscalização dessas transações e a importância que isso tem na realidade do brasileiro. Deveriam ter feito um plano de ações que informasse primeiro e depois aplicar a legislação. Um plano de ações, outros de comunicação e, claro, um planejamento de crise. Isso se chama Análise de Cenário, que todo assessor deve aprender para atos importantes de um mandato. 

A falta dessa análise profunda fez o Governo cair no segundo grande erro: ter deixado a Secretaria de Comunicação (Secom) “rendida” – uma expressão técnica para quando não se aciona o setor para que ele possa alertar sobre possíveis percalços e tenha condição de produzir uma campanha e materiais que traduzem todo um texto técnico na linguagem popular. 

O terceiro erro foi ter colocado em pauta uma medida tão polêmica no meio da troca do Ministro da Secretaria de Comunicação. Ou seja, nem se deram conta de que não haveria equipe para lidar com uma crise mais que anunciada. Essa mudança contribuiu e muito para o erro quatro: a demora na resposta da presidência e a produção de material institucional para negar as fakes news e informações distorcidas (outro fator que não se pode negar). Foram mais de seis dias para lançar um post sobre as novas diretrizes e que é superficial.

O ideal teria sido uma mobilização digital, com conteúdos de rápido disparo e compartilhamento e checagem de informação, feitos em sincronia com ações em rádio, TV, portais de notícias e redes sociais. Era hora de levar especialistas e porta-vozes em programas populares e de massa, como Ratinho, Ana Maria Braga, Cidade Alerta, Jornal Nacional e da Globo. Responder de forma sincera, simples e educativa cada ponto da medida. Acionar o pronunciamento em rede nacional e desmentir o que havia circulado como boato. E, claro, usar micro e médio influenciadores para explicar o que mudava com as novas regras.

Isso tudo, em pouco tempo: em menos de 72 horas. Mas a lentidão nas respostas criou um cenário mais que favorável para a oposição: com materiais bem feitos, argumentos bem estruturados, com distorção de dados mas com apelo sentimental e uma pitada de medo, causaram pânico e uma onda de rejeição ao projeto. Deu nem tempo de entender as regras, mas foi mais que suficiente para circular vídeos e frases prontas que geraram uma comoção tão grande, que a imprensa e os economistas tiveram que assumir a responsabilidade de desmentir todas as Fake News

E foi nesse clima que surfou o vídeo do deputado federal Nikolas Ferreira, com informações comprovadamente distorcidas, mas que representavam exatamente a sensação daquele momento, a incerteza e a falta de detalhes do que estava por vir com a proposta. Ele soube jogar com o sentimento e usar as palavras certas para comover e gerar revolta e pânico nos trabalhadores. E isso a gente viu com comerciantes parando de aceitar a modalidade mais popular como forma de pagamento. O golpe final foi especular sobre uma possível tributação, que convenceu muita gente, mesmo que agências de checagem de dados e a imprensa demonstrassem esses dados errados.

E, assim, o Governo Lula caiu no maior de todos os erros: recuar. No lugar de investir em comunicação, em informação e mostrar a que veio o pacote fiscal de controle do Pix, simplesmente deixou a impressão de que toda a boataria tinha sentido. Mesmo que a suspensão seja temporária, o estrago foi feito. E a “ressaca” que deixou, deve demorar para ser curada. 

Agora, será preciso uma robusta campanha de comunicação para retomar a credibilidade da Presidência e reconstruir todo o projeto. Esse é um bom exemplo, ou case, para demonstrar como a informação pode ser uma ferramenta de controle social, gerando mobilização ou criando uma histeria coletiva. E é por isso que Comunicação deve ser feita por profissionais responsáveis e éticos. 

O grande calcanhar de Aquiles do Governo Lula era a Secom, daí a saída de Paulo Pimenta, que era um grande defensor do investimento apenas em imprensa e mídias, mas que nunca investiu de verdade em um núcleo digital. Isso é uma prática conservadora e bem ultrapassada de marketing político. E quem ainda aposta nessa fórmula, tá ficando pra trás. E esse é o erro da comunicação da esquerda no Brasil. 

As redes são canais diretos com a população e devem ser usadas como fonte de informação. Ainda em momento que tentam fragilizar a importância e o papel da imprensa. Sabemos que uma reputação nas redes vale mais que muito dinheiro. E é, por isso, que chamo esse case de Fiasco do Pix.

Impacto das Fake News 

Um ponto que precisa ser destacado nessa história é o impacto direto das fake news na reação popular e no recuo do governo. A disseminação de informações falsas sobre a suposta taxação do Pix contribuiu significativamente para este clima. A boataria, espalhada de forma massiva e irresponsável, foi suficiente para gerar pânico entre comerciantes e trabalhadores, levando o Governo Lula a anunciar a suspensão temporária da medida. 

Em resposta, o governo anunciou a intenção de acionar a Polícia Federal para investigar pessoas que “agiram contra a economia popular” e responsabilizar legalmente os autores dessas fake news. A Advocacia Geral da União já indicou que vai acionar a PF para investigar os autores dessas notícias falsas, que, além de distorcerem os fatos, conseguiram criar uma histeria coletiva. Esse é mais um exemplo de como a desinformação, quando não é combatida com rapidez e assertividade, tem o poder de desestabilizar um Governo.

*Graci Marques é especialista em Marketing Político e Planejamento Estratégico para mandatos. Assessora de Comunicação Política desde 2004, já trabalhou na Câmara dos Deputados, ALMG  e nos Ministérios da Saúde e da Justiça.

*As opiniões emitidas nesta coluna não refletem necessariamente a opinião do Jornal Alto Paraopeba. 

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