por Graci Marques*
O Brasil ainda comemora as indicações de Ainda Estou Aqui ao Oscar 2025. E se você ainda não assistiu, corre que dá tempo. O filme está em cartaz no cinema de Ouro Branco e vale cada segundo. E eu espero poder te convencer a garantir sua entrada. Ao contrário da minha coluna usual, não vou tecer um fio político para explicar porque esse longa-metragem merece sua atenção. Para quem não sabe, sou uma cinéfila de carteirinha e adoro séries. E há muito tempo não me sentia tocada por um roteiro.
Baseado no livro de mesmo nome, Ainda Estou Aqui, é um filme brasileiro que narra a luta de Eunice Paiva em busca de notícias sobre o marido, o deputado Rubens Paiva, após sua prisão em plena ditadura militar. A película bateu recorde de bilheteria no Brasil, um feito que é difícil em uma era dominada por grandes produções estrangeiras e que, por isso, já é um bom motivo para ser assistido.
Um retrato da ausência
O filme trata de um período político obscuro da nossa história recente e que não pode ser ignorado. Não existe uma cena explícita de violência, tortura ou qualquer referência literal aos horrores praticados. É todo construído em um clima de sugestão e no que pode ser. Isso deixa a história mais densa, com um clima pesado e de suspense. E, mesmo que seja paradoxal, tudo é delicado e sutil. A direção de Walter Salles transforma a história de uma maneira que os silêncios representam toda a dor e ausência de Rubens Paiva. É aquele suspense psicológico que faz o cinema ficar mudo e perder a respiração por alguns momentos.
Foi assim na sessão que assisti numa quinta-feira à noite, em um cinema de interior. Por coincidência, em um Cine Ritz, mesma franquia da cidade. A diferença entre a vida com Rubens Paiva, uma era colorida e cheia de som, alegria e música, muda para um cenário cada vez mais escuro, silencioso e quase sem cor. O que faz de Ainda Estou Aqui um relato pessoal, uma tragédia familiar e não um filme sobre a ditadura. E isso é que mais agrada: é possível sentir essa dor sem precisar ser documental.
A história dos Paiva, uma tragédia familiar, se torna um drama universal. Milhares de brasileiros vivenciaram essa dor e, assim, é possível compreender a história de presos políticos e como suas vidas e das famílias foram alteradas pela repressão do regime militar. Nem é preciso compreender a representação de Rubens Paiva para a história brasileira da época e quem foi Eunice. O filme consegue pontuar a dor de uma família e como esses desaparecimentos (mesmo dos que voltaram após período presos) impactaram nossa sociedade. E mantém viva a memória de um episódio que não pode ser minimizado e nem esquecido. O tema faz parte da nossa memória coletiva.

Beleza onde não há palavras
A direção de Walter Salles é primorosa e ele segue, como em seus filmes e em Central do Brasil, levando beleza e delicadeza naquilo que não é dito, que não tem palavras. O sentimento dos personagens é retratado, em quadros e imagens, não em diálogos. O elenco tem atuações impressionantes e viscerais. Além de Fernanda Torres, que entrega tudo com o mais profundo silêncio, em cenas que não têm uma palavra, mas comovem e nos fazem perder o ar, o filme tem momentos brilhantes.
A breve participação de Fernanda Montenegro também é de tirar o fôlego. Ela surge em poucos minutos e, sem uma fala, emociona e traz vida à narrativa. Selton Mello é Rubens Paiva com tanta humanidade e grandeza, que consegue deixar um vazio gigante durante o filme. E é por isso que a película chegou ao Oscar.
Ainda Estou Aqui” é o filme mais emocionante do ano
Ainda Estou Aqui é uma grande produção e já marcou a história do cinema brasileiro, mais pelas suas qualidades e acertos do que pelo bom desempenho nos prêmios internacionais. E todas as estatuetas recebidas são merecidas. Fernanda Torres realmente dá um show de interpretação. O roteiro de Artur Lorega e Murilo Hauser é impactante e emocional. E Walter Salles brilha mais uma vez sendo autorial, levando tensão e sensibilidade com muita delicadeza.
Se ainda não te convenci, vá pelo bom momento do cinema brasileiro. Ainda Estou Aqui é um filme, além de tudo, emocionante e que vai entrar na lista dos indispensáveis de ser vistos no Brasil.
*Graci Marques é especialista em Marketing Político e Planejamento Estratégico para mandatos. Assessora de Comunicação Política desde 2004, mas uma cinéfila de carteirinha que ama passar o tempo livre vendo filmes e séries.
*As opiniões emitidas nesta coluna não refletem necessariamente a opinião do Jornal Alto Paraopeba.